Perspectiva Regulatória para Código Gerado por IA: O Que Esperar até 2026
Por Bianca Moreira, nov 18 2025 0 Comentários

Se você já usou uma ferramenta de IA para gerar código, já está no meio da tempestade. Em 2025, mais de 40% dos desenvolvedores em empresas de tecnologia usam IA para escrever ou completar linhas de código. Mas o que acontece quando esse código causa um erro de segurança, viola direitos autorais ou discrimina usuários? A pergunta não é mais se a regulamentação virá - é quando e como ela vai te afetar.

O que está em jogo com o código gerado por IA

Código gerado por IA não é só uma ajuda rápida. Ele está entrando em sistemas críticos: aplicativos financeiros, plataformas de saúde, softwares de transporte e até sistemas de justiça. Em 2024, um algoritmo de IA gerou um trecho de código para um app de saúde que, por um erro de lógica, ignorava dados de pacientes idosos. O resultado? Três casos de diagnóstico incorreto. A empresa não sabia quem era o responsável: o desenvolvedor que pediu o código? O time que treinou a IA? O fabricante da ferramenta?

Essa ambiguidade é o coração do problema. Até agora, a lei trata código como obra humana. Mas quando 80% dele é criado por uma IA, quem detém a propriedade intelectual? Quem responde por falhas? Quem garante que o código não copiou trechos protegidos de GitHub, Stack Overflow ou repositórios privados?

O que já está em andamento em 2025

Em maio de 2024, a União Europeia aprovou a Lei de Inteligência Artificial (AI Act), que entrou em vigor em janeiro de 2025. Ela classifica sistemas de IA por risco. Ferramentas de geração de código caem na categoria de “risco moderado” - o que significa que precisam de transparência, documentação clara e auditoria de origem dos dados.

Na prática, isso quer dizer que em 2026, qualquer empresa que usar IA para gerar código em produtos comerciais terá que:

  • Manter um registro de quais modelos de IA foram usados
  • Documentar os prompts e parâmetros usados na geração
  • Provar que os dados de treinamento não violam direitos autorais
  • Aplicar testes de viés e segurança antes da liberação

Os EUA ainda não têm uma lei federal, mas a FTC (Comissão Federal de Comércio) já começou a multar empresas que usam IA para gerar código sem avisar clientes. Em outubro de 2025, uma startup de software foi multada em US$ 2,3 milhões por vender um sistema de automação que usava código gerado por IA sem revelar a origem.

No Brasil, o Projeto de Lei 2.300/2025, que trata da regulamentação de IA, está em fase final de votação na Câmara. Ele propõe que qualquer software com código gerado por IA precise de um “certificado de origem” emitido por um órgão acreditado. Isso pode parecer burocrático, mas é uma resposta direta aos erros que já aconteceram.

Os riscos que ninguém está falando

A maioria das discussões foca em direitos autorais e segurança. Mas há um risco mais sutil: a erosão da competência técnica.

Em 2025, uma pesquisa da Universidade de Stanford mostrou que desenvolvedores que usam IA com frequência têm 35% menos capacidade de debugar código sem ajuda. Eles se acostumam a copiar soluções prontas, sem entender como funcionam. Isso não é só um problema de aprendizado - é um risco sistêmico. Imagine um banco que contrata 50 desenvolvedores que nunca viram um algoritmo de autenticação de verdade. Se a IA falhar, ninguém sabe consertar.

Isso vai levar a novas exigências: empresas poderão ser obrigadas a provar que seus desenvolvedores têm conhecimento técnico mínimo para validar código gerado por IA. Em 2026, ter um certificado de “validação de código por IA” pode virar condição para contratação em grandes empresas.

Balança judicial com mão humana e braço robótico comparando código humano e gerado por IA.

Como as empresas estão se preparando

Grandes empresas já estão criando departamentos internos de “governança de IA para código”. A Microsoft, por exemplo, lançou o Code Compliance Framework em 2025. Ele analisa automaticamente o código gerado por GitHub Copilot em busca de:

  • Violações de licenças (MIT, GPL, Apache)
  • Padrões de segurança conhecidos (OWASP Top 10)
  • Fontes de treinamento não autorizadas

Empresas como Google e Amazon estão usando ferramentas como CodeTrace e AI Code Auditor para rastrear cada linha de código gerado. Se um trecho vier de um repositório privado da concorrente, o sistema alerta e bloqueia a integração.

Startups menores não têm esses recursos. Mas elas não podem ignorar. Em 2026, plataformas como GitLab e GitHub vão exigir que repositórios públicos tenham um arquivo AI-GENERATED-CODE.md declarando o uso de IA. Sem ele, o repositório pode ser removido.

O que você precisa fazer até 2026

Se você é desenvolvedor, gerente de projeto ou dono de uma startup, aqui está o que precisa fazer agora:

  1. Documente tudo: Guarde os prompts, as versões da IA usadas e as alterações feitas manualmente. Isso será sua prova de responsabilidade.
  2. Verifique licenças: Use ferramentas gratuitas como CodeScan ou FOSSA para identificar código copiado de repositórios com licenças restritivas.
  3. Teste como um auditor: Não basta o código funcionar. Pergunte: ele é seguro? Ele discrimina? Ele é explicável?
  4. Capacite sua equipe: Treine desenvolvedores para entender, não só copiar. Aprender a ler e corrigir código gerado por IA é uma nova habilidade exigida.
  5. Prepare um plano de contingência: Se um código gerado por IA causar um problema, quem é o responsável? Quem faz a correção? Quem paga? Defina isso agora.
Mapa global mostrando regulamentações de IA por país com símbolos de conformidade e riscos.

O que pode mudar até 2026

Em 2026, é provável que vejamos:

  • Uma nova categoria jurídica: “código híbrido” - parte humano, parte IA - com regras próprias de responsabilidade.
  • Seguros específicos para desenvolvimento com IA, que cobrem erros de código gerado.
  • Registros públicos de ferramentas de IA usadas em software comercial, como um “CNPJ da IA”.
  • Proibições de uso de IA em códigos para sistemas de segurança nacional, saúde crítica ou infraestrutura.

Países como Japão e Canadá já estão discutindo a criação de selos de conformidade para software com IA. Em 2026, um app que usa código gerado por IA sem selo pode ser banido de lojas de aplicativos.

Por que isso importa para você

Essa não é uma discussão técnica. É uma mudança no contrato social da programação. Antes, o código era um reflexo direto da mente do programador. Agora, ele é uma colaboração com uma máquina que não entende ética, lei ou contexto.

Se você não se adaptar, seu trabalho pode ser considerado não confiável. Seu software pode ser bloqueado. Sua empresa pode ser processada. E você, como profissional, pode perder credibilidade - mesmo que não tenha feito nada errado.

O futuro não é impedir a IA de gerar código. É garantir que ela não gere caos. E isso só acontece se você agir antes que a lei te force.

Código gerado por IA pode ser protegido por direitos autorais?

Em muitos países, incluindo EUA e União Europeia, código gerado inteiramente por IA não pode ser protegido por direitos autorais, pois não tem autor humano. Mas se um desenvolvedor edita, adapta ou organiza o código gerado, a versão final pode ser protegida. No Brasil, a Lei de Direitos Autorais ainda não foi atualizada para esse cenário, mas tribunais já estão começando a seguir a tendência internacional: sem intervenção humana significativa, não há autoria.

Posso usar código gerado por IA em projetos comerciais?

Sim, mas com cuidado. Muitas ferramentas de IA, como GitHub Copilot, permitem uso comercial, mas exigem que você verifique se o código original não copiou código com licença restritiva (como GPL). Se você vender um produto com código gerado por IA, é sua responsabilidade garantir que ele não infrinja direitos de terceiros. Em 2026, isso será exigido por lei em muitos países.

Quem responde se um código gerado por IA causar um acidente?

Atualmente, a responsabilidade recai sobre quem usou a ferramenta - ou seja, o desenvolvedor ou empresa que implementou o código. A IA não é considerada uma entidade legal. Mas em 2026, novas leis podem exigir que fabricantes de ferramentas de IA também sejam responsabilizados se não fornecerem mecanismos de segurança ou auditoria. Isso já acontece com carros autônomos: o fabricante não escapa da culpa se o sistema falhar.

O que é um “prompt de código” e por que ele importa?

O prompt é a instrução que você dá à IA para gerar código - por exemplo: “Crie uma função de login em Python com autenticação de dois fatores”. Esse prompt é parte da cadeia de responsabilidade. Se o prompt for vago ou pedir algo ilegal, você pode ser responsabilizado. Em 2026, guardar logs de prompts será obrigatório em empresas que operam em setores regulados, como saúde e finanças.

Ferramentas gratuitas de IA para gerar código são seguras?

Nem sempre. Ferramentas gratuitas usam modelos treinados com dados de repositórios públicos, que podem conter código com licenças restritivas ou vulnerabilidades. Em 2024, 28% do código gerado por ferramentas gratuitas continha trechos copiados de repositórios privados. Use ferramentas que oferecem auditoria automática ou pague por versões profissionais que garantem limpeza legal do código.

Próximos passos

Se você está começando agora, não espere a lei vir te obrigar. Comece a documentar, testar e treinar sua equipe. Se você já está no meio do caminho, faça uma auditoria interna: quais códigos você já gerou com IA? Eles estão limpos? Você pode provar isso?

Em 2026, quem agir com transparência e responsabilidade vai sair na frente. Quem tentar fugir da regulamentação vai enfrentar multas, processos e perda de confiança. O código gerado por IA não vai desaparecer. Mas o jeito de usá-lo - e de ser responsabilizado por ele - mudou para sempre.